O resultado do PIB no primeiro trimestre de 2020 ilustra os primeiros impactos negativos da pandemia sobre a economia e já revelam a severidade da situação. Mesmo com as medidas de quarentena passando a ser implementadas apenas na segunda quinzena de março, a atividade econômica foi bruscamente afetada e contraiu 1,5% na comparação trimestral dessazonalizada, em linha com o esperado pelo mercado.

Apenas o setor agrícola apresentou crescimento, +0,6% no período, também descontando os efeitos sazonais, contando com a boa safra agrícola, que deve também dar importante contribuição para o desempenho do agronegócio no segundo trimestre, segundo nossa equipe de Macroeconomia.

O PIB da indústria, por sua vez, caiu 1,4% na margem, com todos os subsetores apresentando contração. Nosso time destaca a retração na indústria de transformação, na indústria extrativa (-3,2%) e construção (-2,4%). Já o setor de serviços contraiu 1,6% e apenas as atividades imobiliárias mostraram pequeno crescimento (+0,4%). Destaques para a queda do PIB do comércio (-0,8%) e também do setor de transportes (-2,4%) e 'outros serviços' (-4,6%).

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Pela ótica da demanda, os investimentos cresceram 3,1%, recuperando-se após uma queda de 2,7% no último trimestre de 2019, sinalizando que a economia preparava-se para entrar em um período um pouco mais vigoroso quando foi abatida pela pandemia.

O consumo das famílias, por sua vez, retraiu 2,0%, traduzindo principalmente o desempenho negativo do setor de serviços. O consumo do governo mostrou pequeno crescimento (0,2%), movimento esperado, dada a natureza dessa crise, e que deve ser acentuado nos próximos trimestres, frente ao aumento dos gastos públicos direcionados ao combate da pandemia. Por fim, as exportações líquidas contribuíram negativamente para o PIB, considerando o crescimento das importações (2,8%) e a quedas das exportações (-0,9%).

Olhando à frente, já passado dois meses do segundo trimestre ainda com severas restrições sobre o funcionamento da economia, fica claro que a contração da atividade nesse trimestre baterá triste recorde. Assim, nossa equipe de Macroeconomia prevê uma retração de 9,3% do PIB no período. O setor de serviços deve ser mais duramente afetado, mas também a indústria sentirá forte impacto. A situação negativa do consumo deve se aprofundar, como sugerem as estatísticas de desemprego. Além disso, os investimentos devem também voltar a mostrar forte retração.

No segundo semestre, findada a quarentena, a expectativa é que a economia volte a crescer, contando também com a forte queda da taxa de juros e com os estímulos injetados na economia. Entretanto, a crescente possibilidade de adentrarmos o terceiro trimestre ainda com algumas restrições ao funcionamento da economia deve fazer com que a recuperação seja adiada.

Além disso, o ritmo de recuperação dependerá, em grande medida, do cenário político que, caso volte a se deteriorar, pode comprometer a retomada. Assim, reduzimos a projeção para o desempenho do PIB foi reduzida para contração de 5,7% em 2020 (antes -5,2%).

Contudo, nossos especialistas reconhecem que esse número pode ser mais negativo se o ambiente político for mais turbulento, afetando negativamente as expectativas e as decisões de consumo e investimento.

Mercado de trabalho

Uma situação sem precedentes fez com que mais de 4,4 milhões de empregos fossem destruídos em março e abril, de acordo com os dados da Pnad Contínua. A taxa de desemprego trimestral avançou de 12,2% em março para 12,6% em abril. Entretanto, a piora aparentemente pouco acentuada da taxa de desemprego se deve a uma queda muito forte da taxa de participação, considerando que a quarentena limita a procura por empregos.

Mesmo após o final da quarentena nas principais cidades, o mercado de trabalho deve permanecer enfraquecido por alguns meses, com impacto direto sobre o consumo. Desse modo, nossa equipe projeta uma taxa de desemprego média de 13,6%, terminando o ano em 13,9%.

Inflação

Nesse cenário, a inflação seguirá bastante enfraquecida. Conhecemos o IPCA-15 de maio na semana passada, que surpreendeu negativamente ao registrar recuo de 0,59%, enquanto as estimativas do Safra e a mediana de mercado apontavam quedas de 0,43% e 0,48%, respectivamente.

Em 12 meses o índice passou de 2,92% para 1,96%. Mais uma leitura confirmando o caráter claramente deflaciónario da crise do coronavírus. Na abertura por agrupamento, apenas “Alimentação no domicílio” registrou avanço na variação acumulada em 12 meses. Nos núcleos, menos sensíveis a flutuações pontuais, também foram registradas quedas significativas. A média dos núcleos exibiu recuo de 0,06% em maio, passando de 2,59% para 2,23% em 12 meses, nível mais baixo dos últimos anos.

Além da revisão na inflação motivada pela divulgação do IPCA-15 e do reajuste anunciado pela Petrobras no preço da gasolina (+5,0%) e do diesel (+7,0), nossa equipe de Macroeconomia incluiu na projeção a decisão da Aneel de manter a bandeira tarifária verde ao longo de todo o ano. Como iniciamos o ano em bandeira amarela e projetávamos também terminar em 2020 em bandeira amarela, essa decisão reduziu nossa projeção do ano em 0,1 ponto porcentual.

Dessa forma, nossa projeção para o IPCA em 2020 foi reduzida em 0,2 ponto, passando de 1,7% para 1,5%. Olhando à frente,devido à inércia, a projeção para o IPCA em 2021 caiu de 3,2% para 3,1%.

Selic

O Banco Central (BC) tem destacado a preocupação com o efeito de reduções adicionais na Selic (abaixo dos 2,25%) sobre os preços dos ativos e consequentes efeitos negativos sobre a atividade, o que faz nossa equipe manter a expectativa de que a taxa de juros permaneça estável em 2,25% até meados de 2022.

Contudo, a própria redução da pressão no câmbio, respondendo tanto a uma aparente melhora do risco político, mas também à melhora das contas externas, pode reduzir a resistência do BC em continuar afrouxando a política monetária no 3T20. Dessa maneira, a projeção da Selic em 2020 tem viés de baixa.