A incerteza em relação à aprovação das peças orçamentárias de 2021 vem ganhando uma repercussão maior nos mercados nas últimas semanas. 

Sem a instalação da Comissão Mista do Orçamento (CMO), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), apresentada em 15 de abril, e a Lei Orçamentária Anual (LOA), apresentada em 31 de agosto, não tiveram andamento.

Entenda a LDO e a LOA

Nosso time de Macroeconomia explica que a LDO tem como uma das principais funções orientar a elaboração, execução e alteração da LOA, que estabelece parâmetros para alocação dos recursos. Além de normalmente estabelecer as metas do ano, ela apresenta um rol de despesas obrigatórias e, de forma crucial, determina que não tendo o orçamento sido votado no começo do ano, executam-se os duodécimos do orçamento do ano anterior.

Já a LOA é o orçamento anual propriamente dito. Esta lei estima a receita e fixa as despesas do governo, prevendo todos os gastos do governo para o próximo ano em detalhe. O projeto da LOA, conhecido como PLOA, é encaminhado pelo governo ao Legislativo e se sujeita às considerações e emendas pelos parlamentares. A LOA deve ser encaminhada para a sanção do Executivo e posterior publicação no Diário Oficial até 22 de dezembro.

Caso a LOA não seja aprovada neste ano, a legislação estabelece que o Executivo receba um duodécimo do Orçamento para fazer frente aos gastos obrigatórios, como o pagamento de aposentadorias e pensões, e ao custeio da máquina pública.

Já caso a LDO não seja aprovada, não há a garantia deste duodécimo para fazer frente aos gastos públicos no início do ano. O conhecimento da incerteza fiscal caso a LDO não seja aprovada em tempo hábil sugere que o Executivo irá focar para garantir sua aprovação até o começo de 2021.

Retomada de votações no Congresso

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), anunciou na semana passada que tem expectativa de retomar votações de interesse do governo após o primeiro turno das eleições municipais, ocorrida no último domingo.

Entre os projetos citados estão a desvinculação dos fundos públicos (PLP 137/2020), renegociação de dívidas dos entes subnacionais (PLP 101/2020), BR do Mar (PL 4.199/2020) e autonomia do Banco Central (PLP 19/2019).

Conheça um pouco mais sobre cada um dos projetos abaixo:

Desvinculação dos fundos públicos (PLP 137/2020)

O projeto destina, durante a vigência do estado de calamidade pública, que o saldo financeiro de 29 fundos públicos, apurados em 31 de dezembro de 2019, poderá ser utilizado para o enfrentamento desta pandemia e de seus efeitos sociais, econômicos e financeiros.

Dessa maneira, esses recursos ficam dispensados de cumprir uma exigência prevista no artigo 73 da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, que determina que o saldo positivo do fundo especial apurado em balanço será transferido para o exercício seguinte, a crédito do mesmo fundo.

Além disso, ficam também dispensados de respeitar o parágrafo único do artigo 8º. da Lei de Responsabilidade Fiscal, que requer que os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso.

Assim, o projeto determina que esses recursos sejam obrigatoriamente destinados às despesas do auxílio emergencial, gastos com saúde e de assistência social no orçamento de 2020. Também são destinados, ao auxílio financeiro, às compensações financeiras no âmbito dos entes subnacionais em função da redução de receita durante o período de calamidade de saúde pública, aos programas de manutenção do emprego e da renda do cidadão, às despesas do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social da União, caso as fontes de financiamento apresentem frustração de arrecadação.

Segundo nosso time de Macroeconomia, a expectativa é que a liberação desses recursos contribua para que o Tesouro consiga algum alívio na gestão da dívida pública, que passou a ficar mais desafiadora com a explosão do déficit público em 2020 e a elevação da percepção de risco com relação à economia brasileira.

Renegociação de dívidas dos entes subnacionais (PLP 101/2020)

O projeto busca fazer com que entes com baixa capacidade de pagamento possam voltar a contratar operações de crédito com o aval da União. Em troca, os interessados adotariam medidas de ajuste fiscal de caráter estrutural.

Apresentado pelo Executivo em 2019, o projeto, que ficou conhecido como Plano Mansueto (PLP 149/2019), foi considerado prejudicado após a aprovação de outra proposição, que criou o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus. Assim, em abril deste ano, o deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) apresentou o PLP 101/2020, em que retomou pontos do seu substitutivo ao plano. O texto ainda está em análise na Câmara dos Deputados.

Nosso time de Macroeconomia explica que, além de buscar equacionar a crise fiscal dos entes subnacionais, o governo deve incluir parte dos gatilhos da PEC Emergencial nesse projeto de lei, aqueles que são infrainstitucionais, como vedação de promoções e aumentos salariais.

Para 2021, o impacto é pequeno, dado que já não haverá aumento nominal dos servidores públicos e, segundo a PLOA 2021, o orçamento prevê R$ 2,4 bilhões destinados para promoções e outras ações de carreira.

Entretanto, para os próximos anos, a economia pode alcançar R$ 15 bilhões, segundo cálculos do Ministério da Economia, importante sinalização para cumprimento do teto nos próximos anos.

Nossos especialistas lembram, no entanto, que algumas lacunas podem prejudicar o controle das contas públicas, conforme aponta um boletim publicado pela Consultoria Legislativa do Senado.

Na visão do nosso time de Macroeconomia, o projeto é de importância fundamental para equacionamento da crise fiscal dos entes subnacionais, mas pode colocar em risco o ajuste e postergar o problema, fazendo com que a União tenha que socorrê-los novamente no futuro.

Autonomia do Banco Central (PLP 19/2019)

O PLP 19/2019 foi aprovado no Senado em 3 de novembro e seguiu para a Câmara dos Deputados, agora devendo ser acoplado ao PLP 112/2019, que trata do mesmo tema.

O debate sobre a proposta do Senado avançou com uma emenda adicionada ao parecer do senador Telmário Mota (PROS-RR) para reduzir a oposição ao projeto.

A mudança consistiu em adicionar considerações secundárias para o pleno emprego, apesar de manter o mandato prioritário de estabilidade de preços.

Como a discussão na Câmara dos Deputados deve alterar o texto enviado pelo Senado, a proposta provavelmente só será analisada em 2021.

BR do Mar (PL 4199/2020)

O PL procura equilibrar os interesses dos transportadores de carga com aqueles da construção naval — cuja produção de navios de cabotagem tem sido limitada, exceto no que tange à industria de petróleo (suppliers e outras embarcações).

Ao longo dos anos, a necessidade de se usarem navios nacionais na cabotagem (a exemplo dos EUA) tem sido flexibilizada, mas sempre em caráter temporário e precário.

A proposta atual promove a abertura gradual desse mercado de cabotagem, permitindo que Empresas Brasileiras de Navegação ampliem sua frota com afretamento (inclusive a casco nú) de maior número de embarcações estrangeiras (sem compromisso maior de eventual compra de navios brasileiros).

Por outro lado, a proposta cria linha de crédito para estimular a atividade de estaleiros nacionais, inclusive para serviços de reparo. A proposta também facilita o arrendamento de terminais portuários para novas cargas, e cria duas novas diretorias na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ).

O governo manteve a solicitação de urgência para a matéria, que agora está trancando a pauta da Câmara. Mesmo assim, na avaliação do nosso time de Macroeconomia, é improvável que o projeto seja aprovado esse ano dada a redução das atividades legislativas durante as eleições municipais e à falta de consenso em relação ao projeto.