Os dados do PIB referente ao quarto trimestre de 2020, divulgados semana passada pelo IBGE, foram em linha com a nossa projeção e acima da mediana do mercado, confirmando a rápida recuperação após o choque advindo da crise do Covid-19 no país.
Conforme nossa projeção, o PIB do quarto trimestre mostrou alta de 3,2% na comparação trimestral, após ajuste sazonal, e recuo de 1,1% na comparação anual, segundo dados divulgados pelo IBGE. Com isso, no ano de 2020 o PIB contraiu 4,1% e deixa um carregamento estatístico de 3,6% para o ano de 2021.
A rápida recuperação da atividade econômica evidenciada pelo PIB brasileiro no quarto trimestre corroborava com nosso cenário construtivo para crescimento de 2021.
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Ademais, os resultados dos indicadores mais recentes de atividade econômica ainda sugerem continuidade na recuperação. A produção industrial, por exemplo, cresceu 0,4% na margem no mês de janeiro, situando-se 2% acima do nível observado em janeiro de 2020, e em linha com o esperado por nós.
Este foi o primeiro indicador de atividade divulgado para este ano pelo IBGE e, apesar da indústria sentir menos a situação da pandemia, o resultado positivo sinaliza que a economia iniciou o ano de 2021 com boa dinâmica.
Entretanto, as boas notícias ficaram no passado. Assim, não devemos perder de vista que os riscos para a economia não são desprezíveis, por conta:
- da persistência da Covid-19;
- da demora nas vacinas;
- da incerteza em relação à política fiscal e mesmo econômica, levando à deterioração das condições financeiras;
- da redução no poder de compra da população;
- do aumento significativo nos custos de alguns setores, notadamente da construção civil.
O recrudescimento da pandemia obrigou os formuladores de política a adotarem novas medidas de distanciamento social. Evidentemente, a economia não passará incólume a este quadro, uma vez que alguns segmentos terão suas atividades limitadas ou paralisadas.
Restrições à mobilidade
Em um cenário em que as atividades mais dependentes da mobilidade voltem aos patamares de agosto-setembro por 15 dias (período anunciado no estado de São Paulo, por exemplo), o impacto direto no PIB de 2021 seria de 0,2%.
Adicionalmente, os impactos secundários são o retardamento da recuperação do emprego e a solvência de empresas destes setores. Contudo, os impactos secundários podem ser limitados pela reedição do auxílio emergencial e novas políticas de crédito para empresas.
Vale ressaltar que já contemplávamos algum aumento nas medidas restritivas em 2021, motivando nossa revisão anterior de crescimento do PIB de 2021 de 4,2% para 4,0%.
Todavia, reconhecemos que o quadro está pior que o antecipado por nós, implicando em algum viés negativo.
Em tempo, engana-se quem acredita que as medidas restritivas são prejudiciais à economia. Segundo um estudo do Banco Central do Brasil, a atividade na cidade de Manaus no mês de janeiro, em que se colapsou o sistema de saúde da cidade, voltou ao nível mais baixo da crise do Covid-19.
Em um cenário alternativo em que há um colapso nacional do sistema de saúde por 15 dias, o impacto direto no PIB seria de 1,0%.
Além disso, o impacto indireto seria maior do que no caso de aumento de medidas restritivas, pois em muitas famílias a renda dos mais velhos é a principal fonte de sustento. Sendo assim, um número maior de óbitos reduz a massa ampliada disponível na economia.
Imunização, fiscal e economia
No que tange ao programa de imunização nacional, a demora no processo aumenta a probabilidade de que novas rodadas de aumento de medidas restritivas sejam adotadas.
Para além das eventuais fases restritivas, a confiança dos agentes econômicos fica comprometida com a menor previsibilidade.
Ademais, o esperado impulso no consumo com a imunização em massa pode ser postergado caso haja atrasos adicionais na vacinação.
Já a incerteza em relação à política fiscal e mesmo econômica é explicitada pela deterioração dos preços de ativos financeiros, o que pode ser capturado pelos índices de condições financeiras. A perda potencial de PIB neste ano caso não haja uma reversão nesse indicador é de 0,3%.
Ademais, o choque é ainda maior para o ano de 2022, posto que as condições financeiras atuam com defasagem na atividade econômica. Isto é, neste cenário conturbado, o choque no PIB de 2022 poderia chegar a 1,0%.
Inflação
Outro fator que não deve ser negligenciado é que a inflação mais elevada corrói o poder de compra da população.
Caso consideremos ainda que a cesta de consumo dos brasileiros durante a pandemia tenha sido bastante distinta da cesta do IPCA, por conta do menor consumo de serviços e maior consumo de alimentos, por exemplo, a perda do poder de compra foi ainda maior.
Neste contexto, o aumento do salário mínimo, assim como os aumentos dos salários em geral, deve ter sido menor do que o aumento dos preços. Isto é, se por um lado a perspectiva de volta da ocupação aumenta a renda disponível, por outro lado a alta nos preços reduz o rendimento real.
Por fim, a inflação também tem afetado a estrutura de custos das empresas. No caso da construção civil, setor sensível à taxa de juros e ao crédito, que tem se beneficiado do nível extraordinariamente baixo, o setor poderia ser um importante propulsor de crescimento do PIB neste e no próximo ano.
Entretanto, o aumento expressivo dos custos da construção civil levou a um aumento dos preços dos imóveis, queda na demanda, redução na confiança dos empresários e consumidores e consequentemente um menor lançamento de imóveis, podendo assim retirar dinamismo na economia.
PIB com viés negativo
Em suma, em que pese nossa visão construtiva para a atividade, o cenário está bastante incerto e desafiador.
Considerando todas essas variáveis, nossa projeção atual para de contração de apenas 0,1% do PIB do 1º trimestre de 2021, assim como a estimativa de crescimento de 4,0% neste ano, apresenta viés negativo.