Após vários meses com o dólar oscilando perto ou acima de R$ 5,50, a despeito do bom desempenho da balança comercial e da conta corrente, o dólar fechou novembro aos R$ 5,33, uma desvalorização de 7,6%.

Segundo nosso time de Macroeconomia, esse movimento ocorre na esteira de uma melhora significativa das expectativas econômicas ao redor do mundo, que também teve efeito na maior parte dos mercados emergentes.

A apreciação do real — se persistindo — terá efeitos na inflação de 2021 e, assim, sobre a taxa de juros, a qual poderá permanecer inalterada no primeiro semestre do ano. Essa taxa poderá subir a seguir, em um quadro de avançada normalização da economia, na medida em que o Banco Central foque cada vez mais na inflação de 2022, mesmo que o câmbio fique abaixo de R$ 5,00.

Cenário externo favorece emergentes

O fortalecimento do real tem sido acompanhado pelo aumento dos fluxos de capital internacionais para os países emergentes desde a eleição americana.

Segundo nossos especialistas, a definição da disputa eleitoral nos EUA e a sequência de notícias positivas sobre a iminente chegada das vacinas contra o novo coronavírus aumentaram o apetite ao risco dos investidores globais, impulsionando os fluxos de capital para os emergentes.

Apesar de as incertezas com relação ao ajuste fiscal no Brasil não terem desaparecido, o país foi beneficiado por essa mudança de humor dos investidores. Em um ambiente de grande liquidez global e expectativa de novos pacotes de socorro fiscal nos EUA, a redução do risco de cauda do abandono do teto de gastos e consequente quebra do regime fiscal no Brasil facilitou a entrada de capitais ao longo de novembro e a apreciação do real, afirmam nossos especialistas.

Com isso, a moeda passou a refletir melhor o bom estado de nossas contas externas e outros fundamentos, os quais apontam para um dólar com um câmbio bem abaixo de R$ 5,00.

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Por fim, nosso time de Macroeconomia pontua que esse movimento também foi estimulado pela sinalização do Banco Central de que este poderia atuar no mercado de câmbio a fim de evitar distorções associadas a eventuais compras de dólar pelos bancos no fim de ano por conta de alterações na legislação referente ao “overhedge”.

Ao fluxo de capital nas últimas semanas somou-se a mudança na posição de investidores no mercado de futuros de dólar, também ajudando a fortalecer o real.

Apesar do significativo fluxo de investimento direto do exterior, do virtual equilíbrio da conta corrente, e da melhora do fluxo de carteira (para ações e renda fixa), nossos especialistas lembram que não se tem observado variação significativa em nossas reservas cambiais.

O que os fundamentos sugerem para o real

Os modelos de câmbio habituais sugerem um real muito mais apreciado do que o que foi observado ao longo de 2020. Considerando o diferencial de juros, preço de commodities (CRB), percepção de risco país (CDS) e força do Dólar (DXY), nosso time de Macroeconomia afirma que a taxa de câmbio estaria hoje próxima a R$ 4,40.

A taxa de cambio real em relação ao dólar calculada pelo BC (deflacionada pelo IPA dos respectivos países) mostra que o real está hoje mais desvalorizado em relação à moeda americana do que em qualquer época nos últimos 17 anos, inclusive durante a crise de 2008 ou ainda no segundo governo Dilma, quando havia grande incerteza política e os termos de troca da economia brasileira eram bem menos favoráveis do que atualmente.

Assim, apesar das nossas exportações não terem crescido mais do que aquelas de alguns outros emergentes, tais como Indonésia, México ou Turquia, há fatores que sugerem espaço para o real se apreciar.

O principal deles será um avanço significativo na melhora das condições fiscais em 2021, afirmam nossos especialistas. Alternativamente, um aperto monetário em um horizonte relativamente curto poderá ter efeito parecido, desde que ele não seja associado a um quadro de “dominância fiscal”, como quando o aperto monetário leva a uma deterioração ainda maior do quadro fiscal.

A expectativa de manutenção da disciplina fiscal, com o cumprimento do teto do gastos em 2021 e uso mínimo de caminhos alternativos para relaxar o gasto, junto com a recente, mas provavelmente persistente melhora do ambiente externo e a resiliência de nossas exportações, levaram nosso time de Macroeconomia a ajustar as projeções, que indicam agora uma taxa de câmbio de R$ 5,00 ao final de 2021. Para 2020, a projeção é por um dólar a R$ 5,10.

Entretanto, o enorme desafio que a economia brasileira ainda precisa enfrentar para ajustar as contas do governo continuarão presentes no ano que vem, limitando provavelmente que a taxa de câmbio siga apenas os "fundamentos" (embora esse risco devesse estar refletido no CDS do Brasil). Por isso, nossos especialistas afirmam que podemos observar que o real tem, com frequência, apresentado performance inferior às demais moedas emergentes.

Nesse cenário, acreditamos que o real deve seguir apreciando nos próximos meses, beneficiando-se do ambiente global mais favorável ao fluxo externo, do forte desempenho da nossa balança comercial e de algum avanço no processo de ajuste fiscal.

Redução na pressão inflacionária

A expectativa de um real mais forte em 2021, junto com certos eventos recentes, deverá contribuir para uma queda da inflação em 2021, segundo nosso time de Macroeconomia. A projeção para o IPCA no próximo ano recuou de 3,6% para 3,2%.

Para este ano, revisamos na semana passada a projeção do IPCA de dezembro deste ano de 0,84% para 1,31%, levando a inflação do ano fechado de 2020 de 3,9% para 4,4%. Isso após o anúncio da Aneel, que adotou no final de novembro a “bandeira no patamar vermelho 2”.

Apesar da queda da projeção de inflação para 2021, permanecem os riscos altistas, especialmente no setor de alimentação. A demanda externa por grãos e carnes deve se manter forte, explica nosso time de Macroeconomia, enquanto a oferta de algumas commodities alimentares pode se contrair por conta do fenômeno climático La Nina. Esse fenômeno pode também levar a uma escassez de água que resulte em uma bandeira “vermelha” no final de 2021, levando o preço da energia elétrica a subir mais do que os 5% por ora projetados.

Selic em trajetória de alta

Com a inflação de 2021 rodando bastante abaixo da meta de 3,75% para esse ano, nossos especialistas acreditam que o Copom manterá a taxa Selic em 2,0% nesta semana, assim como a prescrição futura que sinaliza que "o Copom não pretende reduzir o grau de estímulo monetário desde que determinadas condições sejam satisfeitas"

Essas expectativas incluem projeções de inflação significativamente abaixo da meta de inflação, regime fiscal inalterado e expectativas de inflação de longo prazo ancoradas.

Essa cautela em abandonar a prescrição futura justifica-se pela incerteza trazida pelo provável encerramento do programa de auxílio emergencial, com queda de renda para larga parcela da população, além da piora do cenário de covid-19 e dúvidas sobre o tempo da disponibilização das vacinas para maior parcela da população.

Além disso, apesar da pressão de curto prazo no IPCA, da inflação de 12 meses atingir mais de 5% em meados de 2021 e a inflação mensal dever permanecer acima do rendimento da atual Selic por todo o primeiro semestre de 2021, a desaceleração da inflação em 2021 e sua convergência para abaixo da meta no final do ano devem dar conforto para o BC manter essa prescrição por mais algum tempo.

Por outro lado, com o peso cada vez maior da inflação em 2022 nas decisões da autoridade monetária, e com a expectativa normalização cada vez maior da economia e, notadamente, do mercado de trabalho adentrando o segundo semestre do ano, nosso time de Macroeconomia acredita que o Copom terá incentivos iniciar o ajuste da política monetária no terceiro trimestre de 2021, levando a Selic a alcançar 3,0% ao final do próximo ano e se aproximar de um nível mais próximo do neutro (4,0%-5,0%) em 2022.

O abandono da prescrição futura ainda na primeira metade do ano é sugerida por esse cenário, com a volta ao regime normal de metas de inflação.

A gradual normalização da política monetária tornará ainda mais importante o uso de cautela na retirada de outros mecanismos estimulativos, afirmam nossos especialistas, especialmente aqueles ligados ao crédito, como a redução de depósitos compulsórios ou requerimentos de capital dos bancos, ao longo de todo o ano de 2021.