A semana foi marcada por intensa volatilidade no mercado brasileiro, com os ativos reagindo tanto às incertezas geradas pela crise do coronavírus e suas implicações para o crescimento global, mas também às turbulências do cenário político doméstico.

O estresse do cenário político traz preocupações tanto quanto à maneira como o governo vai lidar com a questão da pandemia, mas também quanto à continuidade da linha mestra da política econômica e as chances de retorno à agenda de reformas passada a fase mais aguda da crise de saúde.

O dólar teve forte valorização ante o real e chegou a ser cotado a R$ 5,75, terminando a semana em R$ 5,58 após o Banco Central entrar ofertando dólares no mercado. Ao mesmo tempo, ao longo da semana, foi aumentando a perspectiva com relação ao tamanho da redução da Selic que deveremos observar nas próximas reuniões do Copom, em resposta aos efeitos da crise sobre a atividade econômica e a inflação.

Nesse cenário, surgem algumas análises sugerindo que a redução adicional da taxa de juros poderia colocar mais pressão sobre a moeda. A equipe de Macroeconomia do Safra observa, no entanto, que a desvalorização recente da taxa de câmbio não parece ser explicada pela queda do diferencial de juros entre Brasil e EUA, mas sim pela piora do cenário externo, que fortalece o dólar e as implicações desse cenário para a economia brasileira, afetando negativamente a percepção de risco e a expectativa com relação aos preços das commodities.

Obviamente que a expectativa com relação à reação do governo em resposta à crise afeta também a percepção de risco, influenciando igualmente a taxa de câmbio. Além disso, vale observar que o diferencial de juros entre Brasil e EUA chegou até a voltar a aumentar esse ano, depois que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) levou a taxa básica para o intervalo entre 0% e 0,25%, em resposta à pandemia.

Dólar mais forte

Disto isto, com a expectativa de novas quedas da Selic, o diferencial de juros voltará a se reduzir. Além disso, considerando as implicações da crise tanto sobre a economia global como doméstica, que devem levar não só a
uma forte desaceleração do crescimento no segundo trimestre, mas também à um ritmo lento de recuperação no segundo semestre, parece improvável que a percepção de risco e a demanda global que afeta preço das commodities
voltem para patamares próximos ao observado no início do ano ainda em 2020.

Adicionalmente, os EUA injetaram um volume descomunal de estímulos para amenizar os efeitos da pandemia sobre a economia, e devem começar a se recuperar antes dos demais países, sendo uma economia muito dinâmica, fortalecendo o dólar. Dessa maneira, o potencial de apreciação do real ao final do ano parece menor do que nosso time de Macroeconomia esperarava e, assim, passamos agora a projetar a taxa de câmbio a R$ 4,90 ao final de 2020.

Projeção para Selic

Entrando, na discussão da política monetária, o BC tem destacado que o pilar de atuação da autoridade monetária é norteado pelo princípio da separação entre política monetária e cambial. Campos Neto expressou preocupação com a saída de capitais de economias emergentes. Contudo, o BC não parece acreditar que a forte desvalorização cambial em março e abril está relacionada com a expectativa de novas quedas na Selic.

Importante destacar a alteração recente na comunicação da autoridade monetária e suas implicações para a política monetária. Desde o início da crise, o presidente Roberto Campos Neto ressaltou que, em sua avaliação, a elevação do custo do crédito observada em virtude da crise estava em grande medida relacionada à elevação do custo de liquidez do mercado e custo de capital exigido dos bancos.

Assim, a autoridade monetária anunciou uma série de medidas para injetar liquidez ao mercado bancário e de capitais, bem como para afrouxar as exigências de capital, que deveriam impactar positivamente a oferta de crédito na economia. Além disso, Campos Neto reconheceu que na última reunião do Copom não havia ainda muita clareza sobre as implicações da pandemia sobre a economia, nem como sobre a maneira que o governo reagiria e os efeitos sobre a política fiscal.

Contudo, em fala recente, Campos Neto admitiu que o cenário para a atividade econômica parece muito pior que o antecipado e a incorporação de uma expectativa de crescimento negativo para o PIB deve reduzir substancialmente as projeções de inflação do BC. Adicionalmente, deixou claro que a política monetária ainda tem poder e que não estamos no "lower bound" ainda, sugerindo que o custo do funding também é uma variável que pode ajudar a reduzir o custo do crédito nesse momento.

Por fim, destacou que as propostas de estímulo fiscal anunciadas até o momento são todas de caráter temporário, não representando uma deterioração fiscal permanente. É fato que a piora, mesmo que temporária, das contas públicas e a queda de produtividade da economia brasileira devem levar a uma elevação da taxa de juros neutra da economia brasileira. Entretanto, a forte queda do PIB deve elevar de maneira significativa o nível de ociosidade da economia, exigindo estímulo monetária ainda maior.

Segundo nossas estimativas da Regra de Taylor, na qual verificamos a taxa de juros que deveria ser adotada pela autoridade monetária, com nossa queda de PIB, ociosidade da economia e inflação, deveríamos observar a Selic abaixo de 3,00%. Contudo, a recente deterioração do cenário político deve levar o Copom mais uma vez a adotar uma postura mais cautelosa, frente às incertezas dos desdobramentos dessa situação sobre a política econômica e agenda de reformas.

Assim, tendo essa hipótese por base, mas também destacando o reconhecimento do BC sobre a gravidade da crise e seus efeitos negativos sobre a atividade, esperamos agora que a Selic seja reduzida para 3,00% (ante 3,25% esperado anteriormente). Se a temperatura do cenário político seguir elevada, o Copom deve entregar mais um corte de 50 pontos na reunião de maio e mais um corte de 25 pontos base em junho. Mas, não descartamos, se a temperatura baixar, um corte mais agressivo de 75 pontos base já na próxima reunião.