A julgar pelos dados econômicos mais recentes, a atividade brasileira segue em trajetória de recuperação, sem mostrar sinais de reversão, apesar do recrudescimento da pandemia nas últimas semanas.

Nesse contexto, a equipe de Macroeconomia do Safra destaca que a economia caminha para terminar 2020 em ritmo bastante próximo ao verificado no último trimestre de 2019, ainda que com diferenças fortes entre os setores – a indústria segue bastante acelerada, enquanto os serviços se mostram mais atrasados.

De acordo com o IBC-Br, índice do Banco Central considerado uma aproximação do PIB em base mensal, o país cresceu 0,86% na margem em outubro, ficando apenas 2,61% abaixo do nível observado um ano antes.

Além disso, os dados diários de consumo de energia elétrica do ONS, a prévia da sondagem da confiança da indústria, e os números do índice SafraPay para o varejo e serviços sugerem novo avanço.

Nossos especialistas projetam um crescimento do IBC-Br de 0,4% em novembro, e de 0,3% em dezembro, sem depender da reposição de dias de trabalho por conta de adiantamentos de férias.

Desse modo, a variação do PIB calculado pelo IBGE deve ficar negativa em 1,2% no quarto trimestre do ano, na comparação com o mesmo período de 2019. Nesse caso, a contração da economia no ano deve ser de 4,1%.

Em um cenário mais conservador, sem crescimento adicional da atividade nos dois últimos meses de 2020, o tombo do PIB no ano seria de 4,2%.

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Com isso, a projeção de queda de 4,4% do PIB em 2020 feita pelo Banco Central parece contemplar uma contração do índice de atividade nos próximos dois meses, possivelmente em consequência do recrudescimento da pandemia.

Ainda que o movimento observado recentemente em alguns países europeus sugiram uma contração da atividade menor do que em março, nosso time avalia que novas restrições podem tirar entre 0,1 e 0,2 ponto porcentual do PIB em 2020.

Carregamento estatístico

O carregamento (‘carry-over’, a variação do PIB interanual, caso se considere que não haja variação marginal) ao longo de 2021 deve ser de 3,6%, conforme o cenário-base do Safra. Já sem crescimento adicional nos meses de novembro e dezembro em 2020, esse carregamento seria de 3,3%.

Ou seja, a expectativa de crescimento anual do PIB de 4,4% em 2021 se explica na sua maior parte pela recuperação já ocorrida na segunda metade de 2020, o que indica um crescimento modesto ao longo do ano que vem, com uma demanda interna menos aquecida.

A estimativa de nossa equipe prevê contração do consumo no primeiro semestre e uma suave retomada a seguir. Com o fim do auxílio emergencial, a renda disponível das famílias deve contrair-se significativamente. Contudo, esse efeito será mitigado pela recuperação do emprego e pela ‘despoupança’ das famílias nos meses seguintes.

Vale ressaltar que o extraordinário impulso dado à economia na segunda metade de 2020, de vários pontos percentuais do PIB, não deve se dissipar completamente nos próximos meses. Nos cenários keynesianos, por exemplo, o gasto fiscal tende a ajudar a economia com capacidade ociosa a engrenar e manter-se a seguir em movimento, a não ser que ela tenha um problema estrutural ou um excesso de dívidas que continue a constranger o consumo das famílias e o investimento em geral.

No Brasil, fora a gravidade da pandemia e riscos fiscais, não deveria haver nenhuma força fundamental freando de maneira significativa o crescimento do país. Apesar de restrições pontuais na oferta, na esteira do aumento rápido da demanda nos meses recentes, o setor externo continua se beneficiando de um ambiente favorável, o serviço da dívida externa não é oneroso e o Banco Central deverá ser cuidadoso no ajuste dos juros e especialmente no estímulo ao crédito.

Esse cuidado deve se estender ao tratamento dos depósitos compulsórios dos bancos e requerimentos prudenciais que foram relaxados em 2020, em vista da capitalização saudável do setor bancário e necessidade de apoiar a economia. Embora tenha aumentado, o crédito para as famílias -- consignado, pessoal ou imobiliário -- não está em nível que limite a expansão econômica nos próximos meses, já que seu serviço tem sido suavizado pela queda das taxas de juros.