Os primeiros indicadores disponíveis de atividade econômica após a intensificação do crescimento do número de casos de coronavírus sinalizam elevado comprometimento da capacidade de crescimento ao redor de todo o globo em 2020.

De acordo com o nosso time de Macroeconomia, começa a se consolidar um quadro de recessão global, com a possibilidade de estarmos diante do pior ano de crescimento desde a Segunda Guerra Mundial. 

Nesse cenário, observamos uma reação ainda mais agressiva de governos e bancos centrais, incluindo cortes nas taxas de juros, reintrodução de medidas não convencionais de política monetária, como os programas de afrouxamento quantitativo, adoção de medidas de estímulo fiscal, severas restrições de mobilidade, entre outras. 

No início da semana, foram conhecidos os resultados dos indicadores de atividade na China referentes ao mês de fevereiro. No período, houve uma contração bem maior que a esperada da produção industrial e das vendas varejistas. Importante destacar que as quedas observadas foram muito superiores ao verificado na crise financeira de 2008. 

Embora o número de novos infectados na China tenha se reduzido para próximo de zero nos últimos dias, as rigorosas restrições de mobilidade implicam níveis ainda bastante modestos de atividade, o que deve comprometer seriamente o desempenho da economia chinesa no primeiro semestre. A esse respeito, a medida de tráfego de pessoas, por exemplo, mostrou uma reação em relação ao final de janeiro, mas ainda encontra-se bastante abaixo do verificado usualmente: o grau de congestionamento e o tráfego de passageiros do metrô encontram-se em 85,8% e 45,6% de seus respectivos valores observados em dias úteis comparáveis no ano passado. 

O time de Macroeconomia do Safra destaca que, nos EUA, os indicadores também já começaram a exibir os primeiros impactos da pandemia. Os índices de manufatura das regiões de Nova Iorque e da Filadélfia recuaram significativamente na leitura de março, atingindo os níveis mais baixos desde 2016 (quando reponderados pelo ISM). 

Em ambas as pesquisas, chamou a atenção a redução significativa do componente de ‘Novas encomendas’, enquanto outros componentes, como o de ‘Emprego’, exibiram ajuste mais moderado. Se considerarmos a perspectiva de que a situação do setor manufatureiro deve continuar se agravando, esses índices devem exibir uma piora adicional significativa nos próximos meses. 

Outro indicador que ganhou muita relevância foi o de ‘Novos pedidos de seguro desemprego’, justamente por se tratar de uma medida de alta frequência (sua divulgação é semanal). Na semana encerrada no dia 13 de março, esses pedidos somaram 281 mil, valor que superou amplamente o consenso do mercado (220 mil) e o observado na semana anterior (211 mil). Mais importante, de acordo com dados estaduais preliminares, esses pedidos podem superar a marca dos 2,0 milhões na próxima divulgação. Se confirmado, esse valor será o equivalente a mais de três vezes o máximo observado na série (iniciada em 1966) de 665 mil pedidos no auge da crise financeira de 2008-09. 

A gravidade dos efeitos do coronavírus levou a uma ampliação generosa das medidas adotadas por governos e BCs, estes últimos agindo inclusive de maneira mais rápida e preemptiva do que na crise de 2008. Nossa equipe de Macroeconomia destaca as medidas adotadas pelos bancos centrais dos EUA (Fed), Zona do Euro (BCE) e Reino Unido (BoE). 

No último domingo, o Fed realizou nova reunião extraordinária de política monetária, onde reduziu sua taxa básica de juros em 1 ponto porcentual, para o intervalo de 0,00% a 0,25%. Vale relembrar que o Fed já havia realizado uma reunião extraordinária onde cortou a taxa em 0,5 ponto. 

Adicionalmente, a autoridade monetária adotou uma série de novas medidas de estímulo.

Destaque para a reintrodução do programa de compra de ativos, no valor de pelo menos US$ 700 bilhões, sendo US$ 500 bilhões em títulos do governo americano e US$ 200 bilhões em papéis lastreados em hipotecas (os MBS). Esses valores, inclusive, devem ser majorados em breve, visto que mais da metade dos US$ 500 bilhões em compras de títulos do Tesouro deve ser completada nos primeiros dez dias de programa.

Durante a semana, houve aperto adicional das condições financeiras e o Fed (quase que diariamente) anunciou novas medidas de provisão de liquidez. Na quinta-feira, o destaque ficou para a reativação de linhas de swap com nove bancos centrais, incluindo o Brasil. As operações fornecerão empréstimos de até US$ 60 bilhões aos bancos centrais na Austrália, Brasil, Coreia do Sul, México, Cingapura e Suécia e US$ 30 bilhões para os bancos centrais da Dinamarca, Noruega e Nova Zelândia. 

Tal medida foi usada durante a crise financeira de 2008. Chamou a atenção a ampliação realizada pelo Fed do escopo de possibilidades de compras de ativos, incluindo os títulos de dívidas municipais de curto prazo, permissão que não foi utilizada nem em 2008. 

Também anunciaram um arsenal de medidas de estímulo o BCE e o BoE. Em reunião de emergência na noite da última quarta-feira, o BCE ampliou significativamente seu programa de compra de ativos, anunciando um pacote adicional no valor de € 750 bilhões para comprar títulos públicos e privados e estimular a economia da Zona do Euro. 

Em termos de magnitude, vale notar que esse valor corresponde a mais da metade do PIB brasileiro, calculado em pouco mais de R$ 7,1 trilhões em 2019. O novo pacote se juntará aos dois já em vigor e, dessa maneira, o BCE elevará suas compras mensais para cerca de € 120 bilhões ao menos até o fim de 2020. 

Também em reunião extraordinária, o BoE, na última quinta-feira, reduziu a taxa de juro de 0,25% para 0,1% e aumentou seu programa de compra de títulos. Tal decisão se somou à realizada em 11 de março onde, também em reunião extraordinária, a autoridade monetária havia reduzido a taxa de juros de 0,5% para 0,25%. 

O programa de compra de títulos se elevou em £ 200 bilhões, para £ 645 bilhões até o final desse ano. A autoridade monetária destacou que a maior parte das compras adicionais de ativos será composta por títulos do governo do Reino Unido. 

Em linhas gerais, fica evidente que a situação atual é bastante grave e que os BCs estão reagindo de maneira rápida e agressiva. Contudo, mesmo dispondo de todas essas medidas de estímulo, reforçamos que os efeitos de tal choque devem ser severamente recessivos. Nossa equipe de Macroeconomia alerta que o momento é de elevada incerteza, colocando todas as nossas previsões sob revisão. Ainda assim, nosso time tende a concordar que a probabilidade de uma situação de PIB bastante negativo nos EUA e na Europa em 2020 se elevou consideravelmente. Infelizmente, o crescimento mundial está em xeque.