Comentamos recentemente que a recuperação no mercado de trabalho é uma premissa fundamental para a nossa projeção de forte crescimento no PIB no próximo ano. Essa discussão passa, também, por responder como a economia irá reagir ao fim dos benefícios emergenciais concedidos durante a crise do novo coronavírus.

Em relatório, nossa equipe de Macroeconomia lembra que não há consenso sobre este tema, dado que diversas variáveis devem ser levadas em consideração, resultando em diferentes possibilidades e cenários.

Para nossos especialistas, no entanto, o cenário-base prevê ainda neste ano a recuperação de 5,8 milhões de postos de trabalho, dos quase 9 milhões que foram destruídos ao longo do primeiro trimestre. Mesmo neste cenário construtivo, ao final do ano teríamos aproximadamente 3 milhões de empregos a menos do que na comparação com dezembro do ano passado. O retorno ao nível pré-crise aconteceria apenas em maio de 2021.

Este cenário se baseia na constatação de que grande parte do emprego destruído atingiu os trabalhadores informais de baixa renda e que atuam em setores fortemente impactados pelas medidas de restrição de mobilidade. Para nossa equipe de Macroeconomia, algumas destas vagas devem ser reocupadas com o avanço das flexibilizações das medidas de distanciamento social e com a perspectiva de encerramento do auxílio emergencial.

Nossos especialistas também avaliam que há uma parcela relevante dos trabalhadores informais que perderam seus empregos desde o início da pandemia, mas que estão com a renda familiar maior (ou muito próxima) do que antes da crise por conta do auxílio emergencial. Consequentemente, haverá a necessidade de estas pessoas retornarem ao mercado de trabalho para suprir suas necessidades de renda.

Recompondo a massa de rendimentos

Apesar deste cenário de rápida recuperação do emprego parecer ambicioso, nossa equipe de Macroeconomia explica que alguns fatores nos deixam confortáveis com essa projeção.

O destaque fica para uma abordagem com base na PNAD Covid (esta é a versão da PNAD com a coleta dos dados por telefone e com perguntas relacionadas à Covid-19) , sinalizando para a retomada acelerada já em curso no mercado de trabalho.

Essa pesquisa apresenta dados de pessoas empregadas e afastadas do trabalho por conta da pandemia. Ou seja, são pessoas ocupadas, mas que não estão efetivamente trabalhando – constituindo o conceito de ocupação efetiva, no qual são descontadas essas pessoas que não estão trabalhando.  

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E ela revela que, deste contingente, de maio a agosto, aproximadamente 11,2 milhões de pessoas se tornaram efetivamente ocupadas, e há mais 3,6 milhões de pessoas afastadas devido às medidas de distanciamento social, contra um número que era de 16,6 milhões no início da série, em maio.

Dessa forma, nossos especialistas explicam que, apesar de os números de ocupação ainda não sinalizarem recuperação, o mercado de trabalho está se aquecendo em velocidade bastante rápida.

Desta forma, a velocidade de recuperação de emprego deve exercer papel importante para mitigar a queda da massa de rendimentos ao final do auxílio. Segundo nossos cálculos, a massa disponível ficará apenas 1,2% menor do que o nível observado no final de 2019 após ajuste sazonal. No 2º trimestre de 2021 ela deve voltar ao nível pré-crise e retomará a trajetória de crescimento gradual observada no final de 2019.

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Cenários de estresse

Nossa equipe de especialistas também elaborou outros dois cenários: um pessimista e outro otimista.

  • Cenário pessimista: apenas 3,5 milhões de postos de trabalho são recuperados ainda em 2020 e fecharemos o ano com mais de 5,1 milhões de ocupações abaixo do final de 2019. Assim, a massa de rendimentos estará 4,1% menor no primeiro trimestre de 2021, e não voltaremos ao nível pré-crise no próximo ano.
     
  • Cenário otimista: os postos de trabalhos recuperados em 2020 somaram 6,7 milhões e estarão apenas 2,1 milhões abaixo do nível de referência. Ainda, a ocupação volta ao patamar de 2019 no primeiro trimestre de 2021 e praticamente não se observará choque negativo na massa de rendimentos, na comparação com dezembro de 2019.

Uma variável importante na definição desses cenários é o impacto que o término do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda terá sobre o mercado de trabalho.

O programa permite que as empresas reduzam jornada de trabalho de seus colaboradores ou suspendam contratos de trabalho por até 120 dias, com a contrapartida de manter o emprego por período semelhante à permanência no programa. Podemos verificar que as empresas começaram a aderir em abril, mas o programa foi ganhando mais corpo ao longo dos meses seguintes. Assim, para as empresas que aderiram em junho, assumindo que elas permaneçam no programa pelo prazo máximo, os empregos estariam protegidos até janeiro.

Empresas que aderiram em julho e agosto, fazendo a mesma hipótese, precisariam manter os empregos até fevereiro e março. Dessa maneira, haveria tempo para que a economia se recuperasse e as empresas decidissem por manter definitivamente esses empregos (ou pelo menos parte deles).

Um dos grandes riscos ao cenário de recuperação do emprego – e, portanto, da massa de salários – são eventuais demissões nos setores mais afetados pelas medidas de distanciamento social.

Impulso no consumo

Nossos especialistas afirmam que, apesar do gap na massa de rendimentos após o fim do auxílio emergencial, há a expectativa de que parte da poupança criada nos últimos meses deve ser destinada ao consumo nos próximos trimestres, sendo bastante razoável imaginar algo na faixa de R$ 200 bilhões, o que poderá suprir a queda na massa de rendimentos no início do próximo ano.

Mesmo no cenário pessimista, de acordo com nossa equipe de Macroeconomia, este volume seria suficiente para empurrar o problema da falta de renda para o final do segundo trimestre. Ou seja, os dados de atividade econômica devem seguir apresentando recuperação pelo menos até o primeiro trimestre de 2020.