A evolução recente da economia internacional, assim como da economia e da política nacional, tem alterado com alguma rapidez o ambiente em que a política monetária vem operando, alterando nossa expectativa para a taxa Selic na próxima reunião do Copom, nos dias 16 e 17 de março.

O nível das taxas de juros reais no Brasil (-2% ao ano) está bem abaixo daquele da maior parte dos países emergentes, enquanto a recuperação da economia brasileira na esteira dos estímulos dados em 2020—notadamente o auxílio emergencial — está bem acima da recuperação desses países.

A economia ainda não perdeu totalmente aquele impulso, não obstante a crescente incerteza em relação à trajetória da pandemia em vista do alto número de óbitos nas últimas semanas e das dificuldades para concluir a vacinação da população idosa ainda em março.

Esses dois últimos fatores têm motivado a extensão das transferências de renda para a população fora da força de trabalho formal (auxílio emergencial), enquanto o mercado de trabalho não se recupera totalmente.

Como não tem havido evidência clara de que esse novo auxílio será acompanhado por medidas de compensação fiscal, o desconforto no mercado financeiro tem aumentado, com reflexos no câmbio que se adicionam à influência da queda do diferencial entre as taxas de juros domésticas e estrangeiras.

Revisão na estimativa de Selic

Nessas circunstâncias, a normalização da política monetária, traduzida pelo aumento da taxa de juros do Banco Central (Selic) em março, provavelmente se dará de forma mais forte do que a que vínhamos prevendo.

Especificamente, diante dos últimos acontecimentos, projetamos que o primeiro aumento da Selic, na próxima reunião do Copom, será de 0,5 ponto percentual, como já em grande parte incorporado na curva de juros domésticos, e não mais de 0,25 ponto percentual, como prevíamos antes.

Com isso, nossa projeção da Selic no final do ano sobe de 3,75% para 4,0%, valor que julgamos apropriado, neste momento, para evitar desvio expressivo da inflação em relação à meta de 2021.

Cenário para inflação

O IPCA-15 de fevereiro registrou variação de 0,48% no mês, muito próximo da nossa projeção e da mediana das expectativas de mercado (0,50%). No ano, o IPCA-15 acumula alta de 1,26% e, nos últimos 12 meses, a taxa subiu para 4,57% (de 4,30% até janeiro).

Apesar de pouca diferença no índice, houve desvios altistas em alimentação no domicílio e bens industriais, em parte por conta do câmbio, enquanto os desvios foram baixistas no grupo de serviços, com destaque para educação, na qual as aulas presenciais continuam prejudicadas.

Na abertura por grupo, “Transportes” contribuiu com o maior impacto (0,22 p.p.), variando 1,11% em fevereiro ante pequena alta de 0,14% em janeiro. Essa aceleração foi resultado principalmente da alta de combustíveis de veículos.

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A segunda maior contribuição para a inflação do mês veio de “Educação” (0,15 p.p.), devido ao reajuste de cursos que é contabilizado no IPCA nos meses de fevereiro e agosto de cada ano. A variação de 2,39% nesse grupo é, no entanto, bem menor do que a que havíamos projetado (3,23%), denotando que o setor de serviços ainda enfrenta dificuldade para reajustar preços.

Por fim, vale mencionar o grupo “Alimentação e bebidas” (0,12p.p.), que segue pressionado, mas cuja contribuição foi ultrapassada por aquelas de transportes e educação.

O câmbio continua pressionando a inflação, que não cede apesar de baixas sazonais que começam a aparecer.

O preço internacional das commodities continua alto, e o câmbio continua depreciado (projetamos um câmbio médio para ano de R$ 5,25/US$ se não houver deterioração no cenário político brasileiro).

A transmissão dessas pressões para os grãos e derivados e proteínas continuará a se fazer sentir no IPCA.

A esperada queda de preços de bens in natura e arroz deve atenuar essa pressão, mas o grupo “Alimentação no domicílio” deve, ainda assim, variar 4,5% em 2021, com o risco de chegar até 6% se o mercado internacional de grão continuar com demanda alta e quebras de safras.

Olhando à frente, nossas projeções para o IPCA de fevereiro e março são 0,66% e 0,40%, respectivamente. Dessa forma, esperamos IPCA acumulado de 1,3% no primeiro trimestre do ano.

No ano, mantemos nossa projeção de IPCA para 2021 em 3,9%, revisada na semana passada.

A pressão no curto prazo é explicada pela aceleração em combustível de veículo, seguindo os reajustes recentes de preços nas refinarias pela Petrobras.

Adicionalmente, esperamos mudança da bandeira tarifária de amarela para verde em março, apesar de não excluir a sua manutenção, o que pode elevar a projeção do mês em 0,10 p.p., com queda correspondente no mês de abril.

Alta do IGP-M

A pressão cambial também tem influenciado os preços dos produtos industriais. O IGP-M de fevereiro (alta de 2,53% sobre janeiro, acumulando avanço de 5,17% no ano) corrobora a nossa visão do efeito da elevação dos custos para os bens industrializados.

O IPA, indicador de maior peso do IGP-M (60%), registrou alta de 3,28% em fevereiro, muito próxima da de janeiro (+3,38%), mas com maior difusão, isto é, com aumento em maior número de itens da cesta.

As medidas subjacentes de serviços e da média dos núcleos recuaram de 0,75% e 0,65% para 0,37% e 0,47%, respectivamente. Isso se refletiu na desaceleração da média móvel de 3 meses anualizada, que o Banco Central vem acompanhando com cuidado, não obstante a aceleração da média móvel dos preços dos bens industriais.