O IPCA-15 de novembro, divulgado na semana passada, registrou uma alta surpreendente, acumulando 4,22% nos últimos 12 meses. Com a prévia da inflação acima das expectativas, a equipe de Macroeconomia do Safra revisou as projeções para o nível dos preços.

De 3,4%, nosso time espera agora elevação de 3,9% no IPCA de 2020, apenas 0,1 ponto porcentual abaixo do centro da meta de inflação do Banco Central. Já a previsão para 2021 passou de 3,5% para 3,6%, também próxima da meta.

ipca safra _1_.pngNossos especialistas afirmam que o comportamento do grupo de alimentação e bebidas na segunda metade do ano explica mais da metade do aumento desde agosto na projeção da inflação para 2020.

Contribuíram também para a revisão os reajustes de 4% da gasolina e 5% do diesel anunciados na semana passada pela Petrobras, bem como a divulgação do IGP-M de novembro, que indicou taxas mais fortes do que o esperado para bens industriais.

Entenda o aumento esperado para 2021

Apesar do arrefecimento da demanda que poderá ser trazido pelo encerramento dos auxílios emergenciais e da relativa estabilidade projetada para o câmbio no próximo ano, nosso time elevou a projeção para o IPCA em 2021.

De fato, o choque na alimentação no domicílio deve se atenuar com o encerramento do auxílio emergencial e a crescente abertura do setor de serviços, que deve levar a um rebalanceamento da demanda das famílias.

Por outro lado, a demanda externa por grãos e carnes deve se manter forte, enquanto a oferta de algumas commodities alimentares pode se contrair por conta do fenômeno climático La Niña. Assim, nossa equipe projeta elevação de 4,2% para o grupo de alimentos em 2021.

Já a pressão sobre manufaturados, acentuada pela falta de insumos em alguns setores recentemente, deve se manter no curto prazo, mas se dissipar no segundo trimestre de 2021, com maior equilíbrio entre oferta e demanda, e considerando-se ausência de depreciação adicional do câmbio. Nossa equipe projeta desaceleração para uma alta de 2,3% no preço de bens industriais em 2021.

Quanto aos serviços, grupo mais impactado pelo isolamento social, o repasse de aumentos de custos deverá aumentar com a normalização das atividades no próximo ano, como previsto no nosso cenário-base de atividade e emprego. No conjunto, os preços do grupo devem aumentar 3,1% em 2021, ante variação de 1,5% em 2020.

Já os preços administrados também deverão acelerar em 2021, passando de 1,0% em 2020 para 5,3%. Muitos desses itens tiveram seus reajustes postergados ou atenuados em 2020 devido à Covid-19. Entre os itens que estão contribuindo mais significativamente para essa elevação estão a gasolina, a energia elétrica e os planos de saúde. O reajuste máximo dos preços destes últimos em 2021 foi recentemente estabelecido em 8,1%, cobrindo a postergação em 2020.

A energia elétrica deve variar de -0,1% em 2020 para 6,5% em 2021, por conta da compensação de perdas das distribuidoras durante a pandemia e da previsão de escassez de água para a geração hidrelétrica.

Os reservatórios das regiões Sudeste e Centro-Oeste, que representam 70% da capacidade de armazenamento do país, encontram-se hoje com 20% de sua capacidade, e poderão chegar a março com níveis relativamente baixos. Em nosso cenário-base, 2021 encerrará com bandeira tarifária amarela, frente à bandeira verde no fim de 2020.

Implicações para a política monetária

Nossos especialistas destacam que a recente subida dos preços ao consumidor deve arrefecer nos próximos meses, mas traz novos desafios ao BC. Isso porque, embora a política monetária estimulativa tenha sido importante para a atividade econômica, ela implicou juros reais de curto prazo negativos.

Desse modo, a curva de juros de mercado aponta uma elevação da Selic ao longo de 2021, talvez antes mesmo do sugerido pela comunicação do BC, em especial no âmbito do forward guidance.

Nosso time avalia que esse instrumento, que sinaliza o comportamento futuro da taxa básica de juros, poderá ser ajustado ainda no primeiro trimestre de 2021, dependendo da evolução das variáveis fiscais e da inflação nos próximos dois meses.

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Ainda que a inflação projetada para 2021 não se encontre acima da meta de inflação, ela certamente não se encontra substancialmente abaixo dessa meta para garantir a permanência de uma política fortemente estimulativa ao longo de todo o ano.

O atual nível da Selic, que tem hoje uma diferença historicamente baixa em relação às taxas de juros internacionais, não favorece a apreciação do câmbio, e consequente desaceleração da inflação. Pelas projeções atuais, a inflação mensal deve ficar até agosto do ano que vem acima do rendimento dos títulos indexados à Selic, caso essa taxa se mantenha nos patamares atuais.

Nesse cenário, a manutenção do instrumento além do primeiro trimestre precisará ser bem justificada, ainda que o regime fiscal tenha sido preservado “na letra e no espírito”, isto é, com a manutenção do teto de gastos e sem ações de criatividade fiscal por parte do governo.

O calendário de reuniões do Copom em 2021, por sua vez, pode postergar uma eventual definição em relação à manutenção do forward guidance. Na reunião de 20 de janeiro, antes da eleição das presidências da Câmara e do Senado, não estará totalmente clara nem a trajetória fiscal para 2021, nem o impacto do encerramento do auxílio emergencial sobre o consumo e bem-estar dos mais vulneráveis.

A reunião de 17 de março será oportuna para uma manifestação, mas poderá ainda ser muito cedo para uma decisão sobre a própria Selic, e um possível aumento seria talvez deixado para maio.

De acordo com essas perspectivas, a equipe de Macroeconomia do Safra estuda antecipar o primeiro aumento da Selic nas projeções de 2021 do quarto para o terceiro trimestre, ou até para o fim do segundo trimestre.