O IPCA subiu 0,54% em janeiro, variação em linha com o consenso de mercado e um pouco abaixo da expectativa do Safra. Surpresas baixistas em energia elétrica residencial, gasolina e produtos de higiene pessoal explicam o desvio em relação à nossa projeção. Por outro lado, houve pressão maior que a projetada em alguns bens industriais, como automóveis, itens de vestuário, aparelhos eletrônicos e mobiliário.

A média dos cinco principais núcleos de inflação variou 0,87% frente a dezembro, valor alinhado com nossa projeção de 0,88%. Apesar de ainda alta, a média móvel de três meses (MM3M) anualizada da variação desses núcleos cedeu de 8,5% para 8,0%. Essa melhora dos núcleos em MM3M deve continuar nos meses à frente, indicando o progresso da desinflação esperada para o ano.

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Mas a composição da variação do IPCA em janeiro gera alguma preocupação. As baixas mais relevantes vieram concentradas em itens voláteis, enquanto o segmento dos bens industriais está rodando acima do padrão sazonal desde maio do ano passado. A estrutura da oferta de alguns desses itens sugere que a redução dessas altas, em razão da retração da demanda, pode ser mais tímida do que temos projetado.

A inflação de alimentos também constitui risco altista. O fenômeno climático La Niña trouxe chuvas muito abaixo do normal para o Sul do país, prejudicando a safra de milho e soja na região. O impacto dessa quebra de safra nos preços de algumas culturas pode ser moderado por dois motivos. Primeiro, a região Centro-Oeste, maior produtora de grãos do país, tem recebido um regime regular de chuvas. Além disso, a safra do meio do ano na região pode compensar a frustração da atual. Ainda assim, a nossa projeção de inflação de alimentos em 4,5% tem viés altista.

Já as variações do preço do petróleo são provavelmente o maior risco à realização de nossa projeção de um aumento do IPCA de 4,7% em 2022. Uma subida do petróleo para US$ 100/barril (+20%) pode se traduzir em um aumento de 0,6 p.p. nas nossas projeções para o ano. Esse efeito pode chegar a 1p.p., se a elevação do petróleo for acompanhada por elevação semelhante do etanol, diesel e gás de cozinha, e uma depreciação cambial de 10%.

A atenuação do impacto do preço do petróleo nos componentes administrados do IPCA por conta da redução da tributação dos derivados de petróleo não deve ser significativa, até pela dificuldade de legislação nesse sentido ser aprovada no Congresso, especialmente se ela for muito abrangente.

O mercado de petróleo continua, é verdade, bastante volátil, com previsões divergentes por conta das tensões na Ucrânia e os efeitos da provável desaceleração da economia mundial, especialmente se o Fed for mais vigoroso no combate à inflação nos EUA.

Um fluxo de capital favorável ao Brasil que se traduza em apreciação do real pode, por outro lado, facilitar a convergência da inflação em 12 meses para abaixo de 5% no final de 2022. Mantido o patamar atual de R$ 5,20 para a moeda americana até o final de 2022, a inflação poderá vir até 0,7p.p abaixo da nossa projeção central, que adotou o dólar a R$ 5,60.

Em suma, enxergamos riscos altistas para a nossa projeção do IPCA de 2022 de 4,7%, e boa parte deles foge do controle do Banco Central do Brasil, especialmente o preço internacional do petróleo. Nenhuma desinflação é fácil e, como tem enfatizado a autoridade monetária, a incerteza no campo fiscal que se traduza em um câmbio mais desvalorizado pode aumentar o tamanho do desafio.