Como apresentamos na semana passada, quando foi divulgado o IPCA de janeiro, a inflação de curto prazo seguia pressionada. A taxa de câmbio mais depreciada e a alta no preço de commodities agrícolas são os fatores que mais contribuem para essa leitura.

No entanto, somam-se a essas pressões os reajustes de combustíveis de veículos anunciados recentemente, também respondendo ao câmbio, mas também à recuperação da demanda global por petróleo e ao choque da onda de frio nos EUA.

Dessa forma, revisamos nossa projeção do ano de 2021 de 3,4% para 3,9%, implicando uma projeção de inflação acima da meta de 3,75%.

O que move a inflação

A preocupação com os preços no primeiro trimestre de 2021, que expressamos nas semanas anteriores, em particular decorrente da aceleração da inflação dos bens industriais e das consequências da piora nas condições sanitárias dos suínos na China sobre os preços da cadeia proteica, veio em grande parte a se realizar.

Outros riscos que temos indicado parecem agora mais prováveis, o que também contribuiu para aumentarmos nossa projeção de variação do IPCA em 2021 para 3,9%.

Adicionalmente, a Petrobras anunciou na semana passada um reajuste de 10% no preço da gasolina e de 15% no diesel (em 8 de fevereiro a Petrobras já havia reajustado a gasolina em 8% e o diesel em 6%).

Projeção da inflação medida pelo IPCA para 2021

Combustíveis

Os principais itens que sofreram revisão foram alimentação no domicílio, combustíveis de veículos e bens industriais.

Permanecemos esperando preço do barril de petróleo tipo Brent próximo a US$65, mas os preços de curto prazo em dólares e o câmbio médio mais depreciado nos levaram a revisar a inflação de gasolina de 5,5% para 7% no ano.

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Vale ressaltar que há uma possibilidade de alívio nesse número caso nosso cenário de taxa de câmbio se confirme, com o real encerrando 2021 a R$5,00/US$, assim como se a OPEP vier a aumentar a produção, como vem acenando mais recentemente.

Alimentação

Os preços da alimentação no domicilio seguem pressionados no primeiro trimestre, mas os itens de hortifrúti devem cair no meio do ano, de acordo com sazonalidade desse grupo, embora não o suficiente para compensar a alta de itens processados e proteínas, bastante influenciados e pela alta no mercado externo.

Indústria

Finalmente, a aceleração da inflação dos preços industriais verificada na segunda metade do ano passado não vem sendo revertida em 2021, em especial no caso de bens de consumo duráveis e semi-duráveis.

Incorporamos essa surpresa altista na nossa projeção e, devido à provável renovação do auxílio emergencial e à alta dos custos de produção, passamos a projetar variação de 3,3% do grupo.

Energia elétrica

O aumento da inflação projetada para 2021 deu-se apesar da incorporação da devolução de R$ 50 bilhões aos consumidores de energia elétrica, que deve se traduzir em uma redução de 27% na conta de luz da maioria das pessoas, ajudando a diminuir o impacto do reajuste anual contratual, que é baseado no IGP-M, índice que aumentou em quase 20% no último ano.

Essa devolução decorre da implementação de decisão da justiça que determinou que a cobrança de impostos sobre a energia elétrica nos últimos anos havia se dado sobre uma base de cálculo errônea. Pela decisão do governo, o imposto em excesso será devolvido no espaço de cinco anos.

Serviços

A inflação de serviços pode vir a ser levemente mais baixa do que nossa projeção. Nossa estimativa para inflação de serviços (+3,1%) pode ser mitigada caso a velocidade de vacinação e a recuperação da atividade econômica que projetamos seja frustrada, atrasando a retomada do setor de serviços.

A menor inflação nesse setor poderia, portanto, melhorar o balanço de risco da alta de preços, que vem puxada pela alimentação, não obstante indicações de que o fenômeno climático La Niña estaria tendo um impacto mais neutro, além do que já incorporamos nas projeções de preços das commodities.

Em nosso cenário de estresse, a inflação de alimentos alcançaria 6% no ano, o que acrescentaria 22 pontos base na nossa projeção de IPCA.

Impactos na Selic

Dessa maneira, apesar de o Banco Central indicar que está olhando mais para 2022 do que 2021 — sugerindo tolerância com uma inflação em 2021 acima do centro da meta — as razões para evitar que o processo inflacionário se consolide apontam para a conveniência de uma sinalização mais forte de normalização da política monetária.

Projetamos um primeiro movimento da Selic em março, não obstante a situação aparentemente ainda frágil do mercado de trabalho informal por conta da forte piora de número de casos, hospitalizações e mortes por conta da Covid-19 nos últimos três meses.