A crise da Covid-19 trouxe um ambiente de volatilidade de preços e incertezas inédito. Para mostrar como alguns dos principais gestores do país estão lidando com o cenário atual, o Safra já transmitiu bate-papos em tempo real com Rogério Xavier, da SPX, e Márcio Appel, da Adam Capital.

Nesta segunda-feira, 03, foi a vez de conversarmos com Carlos Viana e Marcelo Siniscalchi, fundadores da Asset 1. O fundo da gestora foi lançado no segundo trimestre deste ano, mas os profissionais por trás dele contam com vasta experiência.

Com uma bagagem de cerca de dez anos conduzindo um dos principais fundos de investimentos do país, Marcelo Siniscalchi não esconde a cautela diante das altas expressivas que se seguiram aos tombos em março.

“O primeiro momento de recuperação veio muito mais forte no preço dos ativos do que na economia em si", afirma. O movimento pode ser explicado pela intervenção por parte dos governos no mundo inteiro, mas ele lembra que é preciso cuidado com os riscos por trás dos estímulos.

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“Tivemos um choque sanitário, e no final dele você tem a bolsa americana acima dos valores anteriores à pandemia”, ilustra. “Como o mundo vai se comportar quando esses incentivos todos tiverem que ser pagos?"

Nesse sentido, ele avalia que há hoje uma falsa percepção de que todos países contam com a mesmo capacidade de ação, quando, na verdade, os países desenvolvidos têm muito mais espaço do que os emergentes para gastar, diz.

Mesmo entre os países em desenvolvimento, destaca, existe uma diferença grande entre os que têm um endividamento maior, como o Brasil, e aqueles que conseguem mais tempo para pagar a conta.

O gestor entende que o ambiente no curto prazo é favorável, mas ressalta o cuidado para não perder de vista o valor justo dos ativos.

“Nunca tivemos uma situação tão perigosa para um comportamento de manada como temos agora”, alerta. “Com a retirada dos estímulos, as pessoas vão começar a se questionar quais países e empresas estão mais alavancados do que deveriam; uma parte dos ativos deverá ter uma depreciação bastante grande.”

Pandemia e estímulos

O cenário hoje pode ser entendido a partir de dois vetores, conta Viana, ex-diretor do Banco Central, e que também já trabalhou no BC dos Estados Unidos. De um lado, há a dinâmica sanitária da pandemia em si. De outro, as respostas dos governos por meio de políticas de estímulo fiscal e monetário para apoiar a economia.

No primeiro momento da crise, afirma, houve o choque com a paralisação parcial das atividades, que derrubou as economias, situação que gerou muita volatilidade e elevou os prêmios de risco. É nesse contexto que os governos precisaram expandir suas intervenções. Já à frente, prevê, a situação deve se inverter: a crise sanitária deverá se arrefecer com a distribuição de uma vacina, e estímulos deverão ser reduzidos.

O economista entende que o momento hoje é caracterizado por uma combinação benigna dos dois vetores. "Temos um nível muito grande de estímulos, BCs com taxas de juros baixas e pacotes fiscais não vistos desde tempos de guerra, e uma sensação de que o pior da pandemia ficou para trás."

Adiante, no entanto, Viana destaca que existem incertezas fundamentais para o período pós-coronavírus. “Qual vai ser a herança do choque quando os estímulos cessarem? As economias terão capacidade de andar com as próprias pernas?”.

A necessidade de consolidação fiscal também é um tema sensível, acrescenta, sobretudo para países como o Brasil. Isso porque enquanto o ajuste das contas públicas não ocorrer, o país estará vulnerável a uma piora das condições dos mercados globais.

"Os governos estão gastando muito para fazer frente ao choque e se endividando para isso, mas nem todos os países terão capacidade de conviver com esse nível de dívida no futuro e precisarão colocar a casa em ordem".

É por conta dessa transição que a gestora enxerga um cenário desafiador à frente. “Não é razoável supor que o nível de retorno que vimos nessa recuperação dos preços de ativos no passado recente vá se perpetuar”.

Veja a conversa completa abaixo e saiba ainda o que os fundadores da Asset 1 esperam da reforma tributária no Brasil e das eleições presidenciais nos Estados Unidos.